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Cascatas da Namaacha: sete anos depois da seca

sábado, 13 de dezembro de 2008

Felizminha, Como Eu Te Gramo Muito

Provavelmente a raça dos “janotas” e “Dom Juan” que fazem passear a sua classe nos meios sociais da nossa praça, sobretudo os frequentados pelas mais badaladas e sofisticadas raparigas, chamar-me-ão “simplório” ou, pior, “paspalho”. Aceito os dois adjectivos, mas preferia que me classificassem de “ridículo”.
Explico-me.“Feslizminha, eu te gramo muito”, não sendo na nossa gíria uma afirmação amorosa por aí além, é, quanto a mim, a mais bonita e sublime declaração de amor que se pode fazer a uma moça. E eu, ainda moço, bem magricela e desengoçado, a sussurei bastas vezes aos ouvidos de beldades em esquinas nos bairros da Mafalala e Xipamanine, primeiro em Lourenço Marques (Maputo) e mais tarde em Cumilamba e Cariacó, em Porto Amélia, hoje Pemba. Elas, soltando timidamente risadinhas, “gramavam” a valer da declaração. E não é que “caíam” mesmo minha teia...
Ora, não é que hoje um dos nossos mais representativos compositores musicais, Stewart Sukuma, foi rebuscar aquela frase tão simples, tão terna, para muitos “ridícula”, para a cantar numa das suas mais bem apanhadas composições inseridas no que eu considero um dos melhores trabalhos musicais dos últimos tempos – “Khuvu”.
Stewart, pois, celebra o amor, a paixão, com uma simplicidade tal só possível de se encaixar numa obra musical do quilate de “Khuvu”.
Comprei o CD. 405,00 meticais foi o valor, muito para os meus parcos provimentos. Vale o sacrifício. Antes, confesso, e tanto quanto me lembro, de CD´s de música moçambicana, comprei o “Kewa Zambêzia” para me deliciar com a simplicidade musical do Mussa Rodrigues e alguns outros “nós somos cantores moçambicanos”. De outros CD´s dos ditos cantores “Made in Mozambique”, nem se quer me dou o trabalho de os consultar.
Quando entro numa discoteca à cata de música, normalmente o meu polegar só funciona na vasculha de música “MÚSICA” e mesmo assim longe dos “especialistas” em retirar dos computadores sons apenas perceptíveis aos ouvidos de gente que não tem referências culturais verdadeiramente nossas.Nisso, sou ainda muito mais complicado.
Por exemplo: Não compro os CD´s de Fany Pfumo, Alexandre Langa, Lisboa Matavela e tantos outros “velha Guarda” simplesmente porque o melhor deles está apenas nos discos Vinil, que hoje não os há. Nos 45, 33 e 77 rotações. As obras destes “Monstros” da nossa música editadas digitalmente, deixam muito a desejar, não tanto em termos de qualidade técnica das gravações, mas simplesmente porque não as interpretaram com aquela “alma” a que nos habituaram. Despacharam para vender.
Alguns exemplos:“A Vasat Va Lomu” e “Moda “Xicavalu” do Fany tocadas e entoadas pelo próprio nas décadas 60/70, não têm o mesmo “feeling” nas suas versões digitalizadas de hoje. O mesmo se aplica a “Smith Wa Phepuka”, “Candongueiro” ou “A ma Metical”, de Alexandre Langa.
E quando digo cantar com “alma”, posso me referir a uma obra musical que considero excepcional no nosso cancioneiro popular: “Sapateiro” cantada pelo Daniel Langa (irmão do Alexandre) é, meus senhores, algo que “põe no sapato” a versão interpretada por Wazimbo no CD da Orquestra “Marrabenta Star Moçambique”, acompanhado nos coros pelas vozes da Mingas e da Dulce. É que o Daniel está lá “dentro” do que canta, de tal sorte que diz, a dada altura, que quem lhe “roubou” a mulher foi o sapatero e não o sapateiro; que a “mulher” fugiu-lhe num autocarro do Olivera e não Oliveira. Nada aqui há de maneiras de cantar e entoar abrasileiradas como hoje tanto se ouve nos CD´s nacionais.
Mérito aqui vai para as versões dos nossos “monstros” interpretadas quer por Wazimbo e pela Mingas quer por alguns outros – “Hodi” de João Cabaço, Arão Litsuri e Hortêncio do “Alambique” na RDA é uma relíquia – que foram modernamente bem apanhadas e que sabe bem ouvir e dançar em festas “à nossa maneira”.
Voltando ao “Khuvu” do Stewart Sukuma: confesso que o comprei este ano, há menos de um mês portanto, não porque já o tivesse escutado e apreciado na sua totalidade, mas pelo facto de a afirmação “Felizminha, eu te gramo muito” me ter chamado a atenção, assim como a forma magistral como ele (Stewart) e os seus acompanhantes souberam aliar a “boniteza” dos instrumentos convencionais aos recursos tecnológicos à sua disposição. O CD, todo ele, não foi feito com “preguiça”. Ali houve empenho e “alma”.
Na canção “Felizminha,....”, Stewart terá certamente viajado para os tempos da sua meninice, quando escrevia e mandava cartas de amor “simples” e “rídiculas”, o que me fez recordar Fernando Pessoa quando proclama que “Só é ridículo quem nunca escreveu cartas de amor ridículas”.
Aceito ser “ridículo” em questões de coroção, mesmo na idade em que escrevo este comentário. E aconselho a todos que sejamos “ridiculos” nesta matéria e para toda a vida, porque, como canta Maria Bethânia, “a vida, é bonita, é bonita e é bonita”.
Os outros, que não Stewart Sukuma, Wazimbo, Mingas, Hortêncio, Litsure, Matucoco, Mussa Rodrigues, Lázaro Vinho, esses, que continuem “palhaços” e continuem a ganhar os míseros meticais até onde der. A vida é curta, amanhã não passarão do que hoje são as suas músicas: Mer....


* Publicado no Suplemento Cultural do Jornal "Notícias", de Maputo, 20.02.08

Felisminha, Como Te Curto Muito

Ou como o “Kumbú” também verga mesmo aqueles que tentam primar pela qualidade
Ao “Brada” Fernando Manuel, esse incurável noctívago

Um dia após a publicação do artigo da minha autoria “Felizminha, eu te gramo muito” no Cultural do jornal “Notícias” (20.02.08), sou surpreendido, para não dizer defraudado, com as imagens do vídeo-clip da bonita música de Stewart Sukuma, inserida no albúm “Khuvu”.
Tal vídeo-clip – de excelente qualidade técnica, reconheça-se – terá passado pela primeira vez no programa musical “Music Box” realizado por Celso Domingos do canal STV, numa altura em que dois integrantes da obra “Khuvu” (Stewart e Hortêncio Langa) falavam de tudo e mais alguma coisa sobre o estágio actual da música moçambicana.
No essencial estou de acordo com as opiniões por eles manifestadas, sobretudo no que à banalização da nossa música diz respeito, tudo indicando que por imperativos do lucro fácil e ausência de referências culturais dos que procuram ou pretendem ser seus fazedores.
Já no que diz respeito ao vídeo-clip – concepção de cenários, escolha de figurantes e enquadramento no todo da letra e instrumental da “Felizminha ...,” – parece-me que a obra (visual e não sonora) defrauda porque deita por terra a imagem que Stewart quiz dar (e bem) à mulher “Felizminha” que nós outros fazemos dela.
Explico-me:Na sua versão virtual não vislumbrei ninguem que se parecesse com uma única “Felizminha” da minha terra – bela, sensual e até, porque não, pura como um diamante por lapidar. O que vi foram umas tantas raparigas muito ao género a que me refiro no artigo sobre o CD “Khuvu”: Cindinhas, Ginocas, Fifis, Mimis, Lulus, muito ao jeito das badaladas e sofisticadas a que não se “Grama” mas “Curte-se” e deita-se fora.
Mais ainda: a “Felizminha” da música, porque conheço muitas e certamente o próprio Stewart deve as imaginar, não é de seu jeito andar trajada de vestuário das mais famosas Grifis (Levis, Boss, Gringo, Calvin Klein, ) mas sim de saias plissadas com os obrigatórios vincos, para não dizer capulana e lenços com motivos bem nossos, sandálias ou chinelas; não usa perfumes de marca como Paco, Organza, Givenchy e sim pó talco “Johnson” barato; e besunta-se com brilhantina e não com pomadas anti-raios ultravioleta e, finalmente, não usa mecha ou faz tiçagem ao cabelo.
A “Felizminha” da música, ao contrário da do Vídeo-Clip, não conhece a grande cidade e muito menos as suas pecaminosas maneiras de estar e ser; e muito menos faz-se transportar em carros de luxo. A orignal, essa sim, tem o seu mundo circunscrito aos bairros com casas de madeira e zinco, caniço e terra batida (maticadas), e não Flats, Apartamentos ou condomínios. Até o candeeiro a que se refere Stewart ela não tem porque caro. O Xiphefo, isso sim, de tal sorte que a luz esfumarada torna os seus olhos mais brilhantes que o diamante mais bruto. Agora, postes de iluminação pública, não fazem parte dos carreiros ou caminhos estreitos das aldeias ou bairros onde ela vive, onde a lua é rainha e torna-se cúmplice das escapadelas nocturnas para os encontros breves mas fogosos com o namorado.
Stewart: o janota que pretendes ser na “Felizminha, eu te gramo muito”, não faz a barba ou apara o cabelo nos cabelereiros de hotéis ou salões chics de Maputo. Para essas obrigações estéticas, ele tem o profissional que em dias e meses determinados circula pelo bairro ou aldeia para “trabalhar” o cliente certo, munido da sua maleta de papelão desbotado, com máquinas manuais de aço inoxidável e láminas Gillete para o desbaste dos pelos a mais – tudo isto embrulhado em pano impecavelmente limpo e fresco: o cliente não tem dinheiro para pagar o serviço? Não há problema, fica para a próxima cruzada.
O janota da “Felizminha” tem o visual de um Mafarrico (no sentido hedonista do termo), com corte de cabelo “English Cut”, calças justas acinturadas no limite mais ou menos permitido, pente fino à vista no bolso traseiro, sapatos “Beatles” bicudos e, como toque final, um maço de cigarros “LM” com o reluzente Ronson da Picada bem à mostra na palma da mão: andar finório portando um palito entre os lábios e assobio de noctívago assumido mas não tão amarelo como o que ouvimos na actual geração virtualizada.
Finalmente, tenho cá para mim que os janotas das “Felizminhas”, quando muito, faziam-se transportar – quais malabaristas de circo – em Zundaps, V5, Florets bem polidas, aos fins de semana, com tubos de escape de som bem conhecido nos bairros e aldeias. Nada de Katanas ou Hondas, para não de dizer de Carrochas pintadas digitalmente pelo computer.
Ora, chegados aqui, o que levou então Stewart Sukuma e a sua produtora a desfigurar a sua e nossa “Felizminha”? Das duas uma:- Pressa em ter cá fora um produto de saída fácil e rápida, logo de fácil consumo para chorudos ganhos. O que não se pode aceitar num intérprete do seu calibre.- A produtora e os seus integrantes não conhecem a “Felizminha” e, ao que tudo indica, o seu horizonte começa e acaba no bairro mais chik da grande Maputo.
“O Hortêncio Langa inspira-me”, diz o autor de Felizminha. Como? Onde é que o Hortêncio estava para não ter tido a oportunidade de opinar sobre o “crime” contra a pessoa de “Felizminha”?Stewart: Assim não é assim. Curtiste os teus fãns. Eu não Gramei nada mesmo.