Pelo mundo fora


contador gratis

Cascatas da Namaacha: sete anos depois da seca

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Cinema: Madagáscar 2, perdidos em África

É uma das mais aguardadas estreias do ano e o primeiro grande 'blockbuster' para o Natal, com resultados de bilheteira a anunciarem recordes: “Madagáscar 2”, num momento em que a DreamWorks já anuncia a preparação do terceiro filme. Alex, Gloria, Melman e Marty perdem-se em África.

"Quem disse que os pinguins não voam?" Aqui está a prova do contrário. Em Madagáscar 2 reencontramos o leão Alex, a zebra Marty, a hipopótamo Glória e a girafa Melman no mesmo local onde os deixámos no final de Madagáscar. Mas não por muito tempo. Os quatro amigos vão partir num avião recauchutado (que já aparecia no primeiro filme, lembram-se?), pilotado pelo trio de pinguins e com os macacos, o Rei Juliano e Maurício a bordo com destino a Nova Iorque. Mas a viagem não corre como previsto e o avião acaba por se despenhar em África - e daí que o título original seja justamente Madagáscar: Back 2 Africa.

Eis então a oportunidade para estes animais que passaram a maior parte da sua vida enclausurados no jardim zoológico de uma grande cidade encontrarem outros animais como eles e descobrirem o seu lado selvagem. Com algumas surpresas.

Como já acontecia no primeiro episódio, Alex assume o protagonismo. Reencontrando-se inesperadamente com o pai e a mãe, terá de provar ao grupo e sobretudo a Zuba, o leão mau-da-fita, que, para além de ser o rei de Nova Iorque, tem ainda capacidade para ser o rei da selva. O que não será fácil dado que em vez de lutar, Alex é especialista em dançar.

Os outros animais também terão os seus desafios. Enquanto os pinguins contratam todos os macacos da selva e seus respectivos polegares para tentarem arranjar o avião, Marty vai descobrir que é apenas uma zebra igual a milhares de outras zebras, Glória entende que está na hora de acasalar e decide marcar um encontro com o escultural hipopótamo Moto-Moto e o hipocondríaco Melman, às portas da morte, como de costume, decide que é hora de assumir o seu amor por... Glória.

E, pronto, para não estragar as surpresas a miúdos e graúdos, podemos só dizer que, mesmo na selva, Alex não se vai ver livre da velhota de mala em riste ("gatinho mau!").

O primeiro filme estreou-se em Maio de 2005 conquistando imediatamente as audiências. É, até agora, o quarto filme de animação da Dreamworks mais visto, depois de Shrek 2, Shrek 3 e O Panda do Kung Fu. Sucesso nas salas e DVD que até deu origem a um jogo para a Playstation. Entretanto, os pinguins causaram furor, ganharam direito a uma curta-metragem The Madagascar Penguins in a Christmas Caper (2005) e ainda vão ser protagonistas numa nova série de animação The Penguins of Madagascar (2009) - quem foi que disse que os pinguins não voam?

Depois dos resultados e dos elogios com o primeiro filme, a sequela corria o risco de não estar à altura das expectativas. Manteve-se a equipa de realização (Eric Darnell e Tom McGrath) e, na versão original, as vozes também são as mesmas. A produção custou perto de 120 milhões de euros. O filme estreou-se nos Estados Unidos no dia 7 com resultados tão bons quanto o primeiro: no primeiro fim-de-semana conseguiu 49 milhões de euros - a 11ª melhor abertura do ano. Até agora, já rendeu 107 milhões de euros nos Estados Unidos e mais de 45 milhões no resto do mundo.

Por enquanto, os animais ficam na selva. Mas Jeffrey Katzenberg, da Dreamworks, já confirmou que a história vai continuar: "Haverá, pelo menos, mais um episódio. Queremos que as personagens regressem a Nova Iorque".

Caetano Veloso realiza sonho de criança e vira professor

Por: Célio Messias/AE

O cantor Caetano Veloso realizou na tarde desta quarta, 26, em Ribeirão Preto, um sonho de criança: foi professor por quase duas horas. Mas a aula foi diferente, interactiva, via satélite. E para cerca de 40 mil alunos, de 280 pólos da rede ligada ao Sistema COC de ensino em todo o Brasil. "Foi muito boa a experiência", disse Caetano, que falou de um tema que entende, viveu e gosta: "Da Bossa Nova ao Tropicalismo". Pelo acordo com a instituição, e a pedido dele, a aula será disponibilizada a toda a rede pública do País. Caetano também falou, depois, dos seus novos DVD e CD, além de seu blog, e procurou minimizar a crítica do amigo Tom Zé, que o ofendeu num show, domingo (23), no Auditório do Ibirapuera, em São Paulo.

Sentado num banquinho, quase imóvel, apenas gesticulando e com a típica fala mansa, Caetano falou sobre os anos 1950 e 1960, do tema da palestra-aula. Ele espera que as informações que transmitiu ajude muitos estudantes. Até se comunicou rapidamente, via satélite, com a irmã Claria Maria, que estava em Salvador a assistir. Com os vários compromissos agendados, nem encontrou o amigo Gilberto Gil, que faria um show à noite no Theatro Pedro II. Caetano disse que teria que viajar para continuar os trabalhos de estúdio dos seus novos projectos. "Não é incrível? Não vi o Gil", comentou Caetano, que ainda não viu o show Banda Larga Cordel do amigo, mas recentemente o viu no Gil Luminoso, no Rio.


O COC investiu, via Lei Rouanet, R$ 300 mil no projecto da aula e também dos sites de Caetano (www.obraeprogresso.com.br), sobre o DVD e o CD em produções, e de Guel Arraes, que dá uma aula de cinema pela internet. Caetano disse que aprova a novidade tecnológica, como Gil, que incentiva o público a gravar os seus shows e exibi-los no ciberespaço. "Cada um vai se adaptando aos poucos, e achei que as companhias de disco não acompanharam ou não foi possível para elas, acabar com aquela estrutura, mas não entendo de produção, de dinheiro", explicou Caetano. E ele recordou que no seu blog incluiu as músicas em produção, gravadas ao vivo, com o mesmo arranjo que terá no CD. "Está tudo disponibilizado", disse.


O novo CD já tem nome: Zii e Zie. Ou, traduzindo do italiano: Tios e Tias. Motivo: "Vi escrito numa tradução para o italiano de um livro do escritor turco Ohran Pamuk (Istambul), que ganhei de presente de uma moça italiana." E acrescenta: "A gente olha e não consegue entender qual a língua, achei bonito..."


Meia-entrada


Caetano não gostou da idéia de limitar em 40% a meia-entrada nos espetáculos culturais. "Há algumas perversões nessa questão que já vem há algum tempo", disse ele, referindo-se a shows em capitais, muito caros, para compensar os ingressos de meia-entrada. "Acho que se tem meia, tem que cobrar, mesmo que todos paguem, sou contra isso." O cantor espera que diminua o número de carteiras falsas de estudantes e não concorda com os produtores que elevam os preços para compensar o risco de ter quase que só vendas de meias-entradas. "Existem mil possibilidades, não sei..." E brincou: Eu só pago meia, porque sou idoso. Vou com meu filho de 11 anos e compro duas meias e não entro na fila."


Filme


A ex-mulher de Caetano Veloso e produtora de cinema, Paula Lavigne, disse que o COC poderá ser um dos patrocinadores do filme O Bem Amado (que terá Marco Nanini como Odorico Paraguaçu), que está em fase de captação e pré-produção. As filmagens começarão em janeiro. Chaim Zaher, dono do COC, tem intenção de patrocinar, mas falta chegar a um acordo sobre valores. "Tem muito a ver com educação", disse Zaher, sobre o filme, que já foi novela e seriado da TV Globo entre os anos 1970 e 1980. Zaher também pretende estender a aula interativa, com outros artistas, personalidades e políticos, mas não divulgou para quando.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Luís Represas prova a lingua viperina da Rosa Langa

O cantor português Luís Represas, esteve recentemente em Moçambique, onde actuou em duas ocasiões, ao lado dos músicos moçambicanos, entre eles, Stewart Sukuma e Hortêncio Langa.
A jornalista da Rádio Moçambique, Rosa Langa, teve a oportunidade de conversar com Represas e não resistiu a fazer-lhe algumas perguntas, algumas das quais ireverentes como só ela sabe ser.
Eis alguns excertos dessa entrevista desta que entre a classe de jornalistas é conhecida por a jornalista "4x4".

Rosa Langa (RL) – Na sua carreira, qual foi até agora o seu “cachet” mais alto que recebeu?
Luís Represas (LR) – Não faço a mínima ideia e vou dizer-lhe porquê ... porque, felizmente, desde há muito que os contratos e os dinheiros não passam por mim. Passam pelo meu agente no qual eu tenho total confiança. Uma boa relação. Isso é uma enorme tranquilidade para o artista.
RL
– Sempre que precisa de dinheiro, ele está lá?
LR – Ou não (risos) ... mas que as contas estão certas ... há uma total liberdade da parte dele para negociar as coisas ... estou perfeitamente tranquilo... havendo sempre uma conversa, obviamente, mas muito mais do lado artístico, sobre o que eu quero fazer ou não em termos artísticos. Do lado negocial, do lado monetário ... eu acho que é engraçado, os artistas têem que ter algum pudor, claro que gostam de receber algum dinheiro. Mas no geral todos têem algum pudor em falar, em negociar essas coisas. Não é porque sujam as mãos, porque não ... porque é dinheiro limpo.
RL
– Antes pelo contrário ....
LR – Porque é legítimo, não é? Acho que nós não nos valorizamos se não valorizamos com quem trabalhamos. Nós, tendencialmente, seriamos mais enganados ...
RL
– Esta é mesmo para fechar ... hé... de cada show que tem realizado em Portugal e por esse mundo fora, faz antes um ritual?
LR – Há uma coisa que eu gosto muito de fazer sempre, que é jantar antes de tocar. E jantar com toda a minha equipa: os músicos e os técnicos. Não é um ritual mas acaba por ser um ritual quase ... não quer dizer que se não jantarmos qualquer coisa vai correr mal.
RL
– Não terminam assim numa reza, uma “Ave Maria”?
LR – Não, não, não. Eu acho que essa reza tem muito mais a ver com a comunhão entre nós todos que estamos à mesa antes do espectáculo, com um bom jantar, onde falamos de tudo menos de música. Das coisas da vida, falamos ....
RL
– Falam de mulheres, por exemplo?
LR – Falamos de mulheres, falamos de homens de tudo ....
RL
– De que mulheres vocês falam mais?
LR – Falamos das nossas mulheres, porque falar das mulheres dos outros é complicado, não é?
RL
– Mas existem mulheres de ninguém?
LR – Há sim. Mas isso cabe a quem descobri-las e ficar com elas. Mas falamos da mulher. Ela, por si, é um tema fantástico, porque é sempre um tema misteioso.
RL
– Que partes da mulher é que aprecias mais?
LR – A cabeça.
RL
– Porquê a cabeça?
LR – Porque é um mistério.
RL
– E quando está com ela começa a carícia pela cabeça?
LR – (Risos) Ah ... estás a falar disso? Não. Fisicamente para mim, as mãos e os olhos são elementos fundamentais numa mulher. As mãos dizem muito.
RL
– E o olhar também ... começa aí uma boa conquista...
LR – Obviamente que sim. Não vou dizer aquela frase “que os olhos são a porta da alma”, mas que são, isso são.
RL
- Obrigrada

José Saramago fala de seu novo livro, 'A Viagem do Elefante'

Entrevista de: Ubiratan Brasil, de O Estado de S. Paulo

Uma certa fragilidade ainda é aparente, resquício de uma grave enfermidade respiratória que quase o matou. Mas, aos 86 anos, o escritor português José Saramago, Prêmio Nobel de Literatura, enfrenta com rara lucidez e energia renovada seu novo tour pelo Brasil, promovendo agora o lançamento mundial de A Viagem do Elefante, livro em que narra a aventura verídica de um elefante que rumou, em 1531, de Lisboa a Viena, presente de um rei português. "Tive algo semelhante a três pneumonias, perdendo 20 quilos em pouco tempo", disse o autor de sucessos como Ensaio sobre a Cegueira, A Caverna e O Evangelho Segundo Jesus Cristo, em entrevista ao Estado, na segunda-feira, depois de homenageado por funcionários da editora.

O senhor gosta de dizer que A Viagem do Elefante é mais uma história que um romance. Por quê?
Na verdade, eu prefiro chamá-lo de conto. Não me preocupei com o número de páginas para defini-lo devidamente, mas, nesse livro, não há nenhum ingrediente que se costuma encontrar em um romance, como um conflito complicado ou um problema de família. A própria forma de narrar é a de contar algo, daí eu tê-lo chamado de conto, como apropriadamente consta na edição brasileira. Em Portugal, porém, isso não foi aceito e lá chamam de romance. Como não quis entrar em uma discussão sem sentido, não argumentei, mas preferia que o tratassem então de "livro" e não romance.
O enredo é inspirado em fatos históricos, mas a possibilidade de poder criar personagens fictícios foi o que mais o atraiu?
Sim, pois os fatos históricos preencheriam apenas duas ou três páginas, com todos os pormenores. Não mais que isso. Confesso que não esperava escrever um livro com mais de 250 páginas - acreditava chegar a, no máximo, 120. Mas, como tive de inventar situações, seu tamanho ficou maior. O que me agrada no trabalho final é o fato de o leitor ser conduzido pela linguagem e não apenas pelo enredo. Como autor, acredito que a escrita é ao mesmo tempo atual e referente ao momento em que se passa a história, século 16. Fiz, então, uma simbiose entre o português que falamos hoje e o que se escrevia naquela época. Acho que ficou bem resolvido, pois introduz uma dinâmica diferente: o leitor é constantemente surpreendido (como eu mesmo fiquei) com certas palavras e construções frásicas.
Como foi essa surpresa?
Foi algo que não posso dizer que tenho explicação. Mas vou tentar explicar. À medida que envelhecemos, vamos acumulando aquilo que chamo de segmentos lingüísticos. Hoje, não falo como quando tinha 8 anos nem sequer quando estava com 30. Há uma espécie de camadas que vão se acumulando, do mais antigo ao mais recente. Tenho a impressão de que, durante a doença que me atacou e da qual tive a rara sorte de escapar com vida (ao menos um médico que me atendeu disse isso), camadas antigas voltaram à superfície. Ou seja, palavras que eu não mais usava ali estavam e figuram na história. Não apenas escrevi o livro, mas o livro também escreveu a mim. Não posso dizer que se trata de uma verdade científica, mas algo realmente diferente se passou pela minha cabeça.
O senhor acredita então que, se não tivesse enfrentado a enfermidade, o livro teria sido diferente?
Possivelmente. Eu contaria a mesma história. No essencial, talvez não existiriam grandes diferenças. Mas, justamente o que não é essencial contribui (e muito) para que essa história se torne única.
Um leitor desavisado, que não soubesse o que lhe passou, não desconfiaria de sua doença, pois o livro é recheado de humor e ironia.
De fato, o humor é o que aparece mais. E assim tinha de ser, pois não gosto de pôr a minha intimidade assim a claro. Quem espera por uma história sombria surpreende-se. Não tanto pelo humor, que está presente em minha obra, mas pela forte presença que nunca antes tinha acontecido. O livro começou a ser escrito em fevereiro de 2007 e, até maio, escrevi cerca de 40 páginas. Não avancei porque minha saúde piorou. Mas, como eu já estava determinado a um certo tipo de narrativa, não houve uma quebra no estilo. Tanto que, 24 horas depois de ter saído do hospital, corrigi aquelas 40 páginas e escrevi o que faltava. É como se houvesse outro eu a escrever por mim. Nesse período, aconteceram coisas muito estranhas. Como ter a visão de um fundo escuro com quatro pontos luminosos, que formavam um quadrilátero irregular. Para mim, aqueles quatro pontos eram eu. É um exemplo de como estava minha cabeça naquele momento e de como estava convicto em terminar o livro.
Suas opiniões sempre são muito apreciadas. Assim, o que se pode esperar do presidente americano Barack Obama.
Em condições normais, seria apenas mais um presidente. Mas trata-se de um negro no comando. É uma revolução, porque invadiu o consciente e o inconsciente de um país que sempre enfrentou o racismo e a Ku Klux Klan.
E sobre a atual crise econômica?
É o que me faz repetir que Marx nunca teve tanta razão como agora.

"Podem me xingar de comunista, não de fascista", diz Saramago, que volta a conversar com o Estado, após dois anos de silêncio motivado por um título infeliz
Fazia dois anos que José Saramago não conversava com o Estado. O motivo foi a discordância do escritor em relação a uma reportagem publicada em 2006, a partir do lançamento de As Pequenas Memórias, um ensaio autobiográfico. Mais especificamente sobre um determinado trecho em que Saramago narra como, aos 13 anos, foi incorporado à Mocidade Portuguesa, ou seja, à juventude que apoiava o ditador português Antônio Salazar.
"Era um garoto e, em um determinado dia, ao chegar à escola, eu e meus colegas fomos informados de que passaríamos a integrar a Mocidade", disse o escritor, que rechaçou, assim, o título da matéria, "Eu fui salazarista". "Eu nunca disse essa frase."
Segundo o escritor, àquela idade, não seria possível fazer uma adesão consciente ("foi algo automático"), diferente, aliás, do que se passou com o alemão Günter Grass, também Nobel de Literatura, que confessou na autobiografia Nas Peles da Cebola (Record) ter pertencido à Juventude Hitlerista, causando grande polêmica. "Isso aconteceu quando Grass já era um rapaz, portanto, consciente de seus atos. Mesmo assim, depois ele teve uma responsabilidade cívica intocável."
O episódio está descrito na página 131 da autobiografia de Saramago. Em 1936, quando começava a Guerra Civil Espanhola, ele, jovem estudante de uma escola industrial, leu nos jornais sobre o conflito, acompanhou o desenrolar dos combates e percebeu que estava sendo ludibriado pelos militares reformados que censuravam a imprensa. Essa foi a razão por que, mandado pelos colegas ao Liceu de Camões para apanhar sua farda verde e castanha da Mocidade Portuguesa, deu um jeito de ficar no fim da fila até que se esgotasse o estoque dos malditos barretes e calções de Salazar.
Saramago julgou o foco do texto publicado no Estado como sensacionalista. "Minha trajetória mostra que jamais fui oportunista, política ou culturalmente", disse ele, entendendo que o jornal havia, portanto, não cometido um erro, mas agido intencionalmente em acusá-lo. "Uma surpresa vinda de um órgão de comunicação ao qual nunca neguei uma opinião ou uma entrevista, um jornal que, para muitos, é como uma bíblia laica de questões políticas e sociais", afirmou. "Poderiam me chamar de comunista que, para muitas pessoas, soa como xingamento, e não para mim; mas jamais de fascista." Para o escritor, não houve erro, mas "uma falta intencional".
Como não recebeu na ocasião a retificação que julgou necessária, especialmente em relação ao título da matéria, Saramago então decidiu não mais conceder entrevistas ao jornal.
O silêncio foi superado nesta segunda-feira, depois de uma reunião do escritor com editores e o diretor de redação, em que se repassaram as circunstâncias da matéria e suas repercussões.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

São muitas as verdades num mundo de natureza vária

O lançamento simultâneo em Portugal, Brasil e Moçambique de Venenos de Deus, Remédios do Diabo é por si uma boa notícia para os que se interessam pelos rumos da ficção em língua portuguesa, pois sugere um avanço na aproximação entre universos ainda tão distantes a despeito das relações historicamente construídas. E confirma entre nós o reconhecimento de Mia Couto. Bastante conhecido nos círculos portugueses e traduzido em tantas línguas, o mais prestigiado escritor moçambicano precisou de mais tempo para que o mercado editorial brasileiro levasse em conta, por exemplo, o grande interesse despertado entre o público universitário, o único segmento que, desde os anos 90, tinha acesso a seu trabalho.
Nos últimos anos, felizmente, abriu-se um espaço para as literaturas africanas e o autor e seus textos vêm merecendo maior atenção, das editoras, da crítica literária, da mídia. Em 2007, O Outro Pé da Sereia ficou entre os dez finalistas do Prêmio Portugal Telecom e foi o vencedor do Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura.
Em Venenos de Deus, Remédios do Diabo, o sexto romance, Mia Couto, como aliás não é raro em sua trajetória, inicia o processo de sedução já no título. Assim, depois de Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra e O Outro Pé da Sereia, para citarmos apenas dois de seus livros, ele vem nos provocar com Venenos de Deus, Remédios do Diabo, que tem ainda como subtítulo As Incuráveis Vidas de Vila Cacimba. Num jogo pautado pela ironia, o peso da contradição será dominante na narrativa que se desenvolve sob uma atmosfera um tanto nebulosa, montada sobre diálogos que tendem a desnortear o leitor, transmitindo-lhe a idéia de que está diante não só de uma terra estrangeira, mas de um mundo que requer outros sentidos para ser penetrado. A opacidade não é defeito, nem é gratuita, é constitutiva de um projeto.
Uma vez mais, o espaço tem grande significado na narrativa de Mia. Vila Cacimba, a aldeia onde se desenrola a trama, pode ser encarada como uma metonímia de Moçambique, talvez do continente africano. Ao caracterizar o médico como português, insinua-se que os séculos de colonialismo não permitiram uma real aproximação entre os patrimônios culturais, pondo em causa o argumento luso-tropicalista que de vez em quando ressurge. Note-se, entretanto, que o essencial não é propriamente falar de sua terra e sim trazer à pauta as muitas verdades que se confrontam num mundo povoado por misturas de natureza vária. Para isso, o autor baralha as personagens, colocando em movimento características que dificultam a sua apreensão, fazendo-as transitar num quadro de significados móveis, em que as coisas podem ser e não ser. E, como o médico estrangeiro, somos levados a um estado de dúvida que também desafia a nossa capacidade de leitura da realidade. Em síntese, da coexistência de mundos, de diferentes tempos e códigos, trata o autor, abordando um problema fulcral em nossos dias.
No conjunto da obra, esse romance se destaca por uma economia narrativa orientada pela concisão, em contraste com a tendência para a exuberância de outros textos. Aqui é tudo mais enxuto: o enredo concentra-se em Vila Cacimba, num curto espaço temporal, envolvendo poucas personagens: o médico português Sidônio Rosa, os casais Bartolomeu Sozinho e Dona Munda, Suacelência e Esposinha. Sobre as suas vidas, paira a figura de Deolinda, apresentada inicialmente como a filha de Bartolomeu e Dona Munda, por quem Sidônio se apaixonara em Lisboa, razão de sua vinda para a África. Nos nomes das personagens, projetam-se marcas de seu modo de estar no mundo, o que remete a certa atmosfera fabular, reiterando um traço indiscutível na obra de Mia: a evocação das tradições orais, matriz dominante no patrimônio cultural de seu país.
Em se tratando do autor, todavia, a combinação dos nomes leva também ao processo de construção da linguagem, sempre merecedor de sua atenção. Se renuncia à constância dos neologismos, um dos pontos de convergência com a obra de Guimarães Rosa, o escritor não deixa de cortejar a poesia na escrita da ficção, cultivando uma espécie de aderência entre o signo e o referente, como se observa não só relativamente às personagens, como também ao lugar. É fato que daí pode resultar a sensação de obviedade mas não se deve esquecer que a coincidência do idioma está longe de significar correspondência de contextos culturais. Vale, então, pensar no procedimento em alusão ao fundamento da poesia, ao desejo de recuperar a unidade perdida, de grande sentido numa sociedade tocada pela desagregação.
O recurso a uma forma de sabedoria popular é outro dado a confirmar a identificação com as tradições orais. Contrapondo-se à contenção no domínio dos neologismos, registra-se a presença de frases que trazem um tom de aforismo, como que procurando sintetizar uma verdade consagrada. Ressalte-se, porém, que no romance as sínteses formuladas pelas personagens atentam contra o senso comum, instituindo uma espécie de contraprovérbio. Em Mia Couto isso se liga à desautomatização do olhar, ato imprescindível para a compreensão do universo que a sua ficção nos traz. É um de seus modos de assegurar à literatura a marca do insólito, uma de suas funções e de seus encantos.
Por: Rita Chaves (professora de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa na USP)

"Temos apenas um nome diferente"


Por: Leonencio Nossa (Jornal O Estado de São Paulo)
O escritor e biólogo moçambicano Mia Couto, de 53 anos, avisa: não é fácil encontrar o escritório onde desenvolve estudos de impacto ambiental, na Av. Mártires da Machava, região central de Maputo. Há 33 anos, os letreiros da cidade à beira do Oceano Índico deixaram de exibir nomes de navegadores portugueses para fazer referência a episódios da história da libertação dos países africanos, a líderes comunistas - como Ho Chi Min e Mao Tsé-Tung - e a heróis terceiro-mundistas como Eduardo Mondlane e Julius Nyerere. Para o autor de Terra Sonâmbula, a mudança se limitou à nomenclatura dos postes.Desde a independência, anunciada no Estádio da Machava por Samora Machel, em 1975, Mia Couto, um dos jovens presentes à festa, viu dois países tomarem rumos diferentes. O Moçambique real não atendeu às expectativas de quem esperava o fim da miséria e repetiu fórmulas políticas e sociais contestadas. Da caneta e do bloco de anotações do jornalista surgiu outro Moçambique, um espaço onde a língua portuguesa se renovou e negros e brancos usam a memória e a magia como formas de resistência. "Nós pensávamos que iríamos inventar um país com um sistema próprio, fundamentado na cultura moçambicana, e agora percebemos que temos um país como os outros. Só temos um nome diferente", diz.As construções portuguesas em estado precário, os mercados enfumaçados, as ruas que remetem a uma cidade brasileira dos anos 50 e a tranqüilidade e a descontração das pessoas nas calçadas não destoam, porém, da própria figura de Mia Couto e do clima de mistério de seus livros. Ele conta que não soa como ficção em Moçambique alguém dizer que um homem virou uma árvore. De camiseta e calça jeans, este nome certo nas listas futuras de candidatos ao Prêmio Nobel revela, bem-humorado, que não vive só de literatura e como encara o ofício literário: "Não sou apenas escritor, também faço coisas sérias."
O secretário da Academia Sueca, entidade responsável pelo Nobel, afirmou que os EUA são um país insular e ignorante para competir com a Europa. Onde fica o escritor africano ou latino-americano nessa disputa de poder cultural?
Como chegou até mim, o debate incluía só escritores europeus e americanos. Parece que o resto do mundo estava oculto. O problema é que essas generalizações levam sempre a erros gravíssimos. Os europeus são tantos e tão diversos! Nós todos somos tantos e tão diversos! Quem são os africanos? Que tipo de generalização eu posso produzir sobre os africanos? Há o estereótipo de que os africanos têm essa pujança literária e histórias para contar. Por que os europeus também não têm? Tenho dificuldade em entender essa espécie de marca de nascimento. A verdade é que o gênero do romance nasceu na Europa, mas, mesmo lá, sofreu diversas revisões. Temos a contribuição dos árabes na poesia, no conto. É um erro tentar classificações.
Ser ignorado é pior que ser atacado?
Sim. Nós somos simplesmente colocados na sombra, à margem. Há uma completa omissão. Não se trata de engano. Parte de gente que tem responsabilidade intelectual e aprecia o panorama literário internacional. É uma espécie de condenação que vai durar muito tempo. Quando nós pensamos que já foi, vem essa espécie de reincidência. Há um certo racismo no sentido cultural, uma certa hierarquia eurocêntrica.
O senhor vê alguma dificuldade especial nesse panorama para a literatura africana de língua portuguesa?
Estamos na periferia da periferia. A literatura africana só é reconhecida na Europa se corresponder a esse estereótipo do que é a África, algo exótico, de um velho contando histórias perto de uma fogueira, dos feiticeiros, dos curandeiros. São estereótipos a que um escritor quase tem de corresponder para ser aceito na Europa. E só a partir da Europa é que é possível chegar ao Brasil. Se eu não fosse reconhecido em Portugal, teria dificuldades de ser reconhecido em outros lugares. Essa triangulação é uma herança colonial. A língua portuguesa é a última das línguas. Eu só existo se sou traduzido para o francês.
Os estereótipos da época colonial permanecem? Isso não mudou?
Não. De certa maneira ficou mais grave porque os próprios africanos se transformaram em agentes da sua colonização. Os africanos, para abrir as portas, começaram a construir os seus pilares de identidade com esses estereótipos. Os africanos têm jeito para dançar, são alegres e têm maiores relações com os mortos. Esses estereótipos foram incorporados e construídos como modos de auto-afirmação. É alguém que se olha para o espelho, mas um espelho inventado por outro.
Mas em Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra o senhor cria um universitário que vai atrás dos contadores de história e dos feiticeiros, se envolve com os mortos. Essa busca é autobiográfica?
Um pouco, sem que eu percebesse. Tem a ver com o fato de eu ser filho de imigrantes. Meus pais vieram muito jovens para Moçambique. Eu não conheci avós e tios. Faço essa alusão à travessia do tempo. A travessia do rio não é no sentido geográfico, mas no sentido da infância. E ali a gente descobre que toda a história foi inventada, a história de sua infância, de sua vida. Tive de inventar meu país, meus pais tiveram de se desdobrar em avós, em bisavós, para eu ter esse sentido de eternidade. Sei que aquilo foi inventado. Sou natural da Beira, uma cidade que teve um processo de mestiçagem muito mais profundo. Quando eu saí da Beira, já aos 16, para viver em Maputo, pensei que tinha vindo para outro país, porque esta cidade é muito arrumada e hierarquizada em termos sociais. Mestiços e mulatos tinham uma ascensão social, nós éramos muito isolados. Em princípio, havia certo drama existencial. Eu descobri que tinha de inventar minha própria identidade.
Ao expressar a cultura de Moçambique de forma sofisticada, o senhor não abre mão de dialogar com seu país, onde há poucas livrarias?
Não vivo isso como angústia. O que eu faço é trabalhar com grupos de teatro, converto meus textos para o teatro. Algumas das minhas peças foram traduzidas do português para línguas locais. Trabalho para rádio e televisão, escrevo para jornais. Tenho uma intervenção pública. Não posso ficar preso ao livro. Mas meu trabalho não é facilitar ou simplificar. Quando faço um livro, é com a complexidade que tem de ter. Não escrevo para o povo. Escrevo para mim, para meus fantasmas. Trabalho de maneira que se possa popularizar a literatura, mas não pela via de simplificação da escrita, de escrever para os que sabem pouco.
O senhor vai acatar as mudanças definidas pelo acordo ortográfico?
Eu vou. Não sou um rebelde em relação a isso. Em Portugal, esse debate se transformou numa coisa muito nervosa. A norma da ortografia não causa preocupação nenhuma. Vamos discutir, sim, os problemas reais que fazem com que hoje não conheçamos a produção literária brasileira em Moçambique, que nos fazem tão distantes em níveis culturais.
Contra quem o senhor se rebela em Moçambique?
A situação é pouca clara. Há várias situações ocorrendo ao mesmo tempo. Há situações positivas. Estamos vivendo uma espécie de embriaguez pelo fato de termos passado por uma guerra civil de 16 anos. No fim da guerra, em 1992, tínhamos a crença de que éramos capazes de construir o resto. Fizemos a paz, fizemos um sistema político aberto, multipartidário, e algumas coisas estão mudando. Temos liberdade de imprensa, de pensamento. Mas há outras coisas que são tristes. Fazemos parte de um sistema internacional. E essa coisa de sermos mais um país como outros é uma coisa muito triste.
Daí a necessidade de buscar em uma tribo nativa um herói nacional, como em A Varanda de Frangipani?
Exatamente. Agora acabou o tempo de gerar, é preciso começar o tempo de gerir, passou esse momento épico. Eu tinha 20 anos quando Moçambique se tornou independente. Havia uma revolução. Havia toda aquela coisa de mudar o mundo, uma ilusão coletiva. Vivemos isso com uma grande pujança.
A última onda de independências na África já tem 30 anos. Ainda é possível usar a colonização como argumento para explicar a miséria?
Esse argumento do passado, essa posição vitimista, está saturado. E isso é bom. Hoje está nascendo na África uma juventude de intelectuais que pensa que essa argumentação tem de ser superada. É preciso começar a apontar para dentro, começar a responsabilizar as elites africanas. Há países que estão piores que na época da independência. E não se pode pensar que é tudo derivado da herança colonial.
Moçambique ainda está no estágio de repetir modelos?
Eu acho que os países do Terceiro Mundo em geral estão repetindo modelos. São poucas as exceções. Moçambique perdeu essa capacidade de resistir. Eu acho que nós tínhamos um posicionamento. Nos primeiros anos da independência, com Samora Machel, nos diferenciamos em relação a outros países africanos porque apontamos o dedo e criticamos o colonialismo na África feito por outro país africano, como o Marrocos, que coloniza o Saara. Essas coisas morreram. Moçambique já não é mais capaz de fazer essas denúncias, que são denúncias corajosas e inovadoras, de quem está livre e emancipado para pensar. O colonialismo não tem raça. A nossa capacidade de criticar o que acontece no Zimbábue morreu. Hoje, as relações de Estado e de convivência estratégica pesam mais. Estou dizendo isso porque o problema principal da África é que ela perdeu o sentido crítico de se avaliar em função de seus interesses. Não se questiona, não se interroga em função de seus projetos.
Qual é a opinião do senhor sobre a política externa do presidente Lula, que adota como uma das prioridades a aliança entre países pobres? No Brasil há quem veja isso como o caminho a seguir, mas também há quem acredite que é perda de tempo.
Não é uma coisa nova. Eu me recordo dos anos 60 e 70, quando havia o discurso da cooperação sul-sul. Mas o que fazia falta, e agora já existe, é que alguns países começam a ser centros importantes, como China, Índia, África do Sul e Brasil, que podem sustentar esses projetos, não como políticas de solidariedade, mas como políticas de eficiência econômica, de intercâmbio comercial, de investimentos. Angola está nascendo também como possibilidade de outro centro importante. Não acredito que se muda o mundo com doações e solidariedade, o que nas relações econômicas conta muito pouco. Acredito que hoje, pela primeira vez, no contexto internacional, alianças entre países pobres podem ser viáveis.
Quais as diferenças e semelhanças entre o sertão de Guimarães Rosa e o interior descrito nos seus livros?
O espaço de Guimarães Rosa não é um espaço físico, é o espaço de uma linguagem que ele criou. Ele criou uma literatura, não uma geografia. O sertão que ele constrói nos livros não é de ordem geográfica. É um sertão que ele inventa para reinventar um Brasil que vivia uma condição que é muito próxima da nossa aqui. Nessa altura estava se fazendo um projeto de homogeneização do Brasil, com a construção de Brasília. Havia um mundo interior, um sentimento de ameaça de alguma coisa que ia ser. E ele constrói esse outro Brasil, mais interior, que ele chama de sertão, como foco de resistência contra essa modernização do Brasil. Aqui estamos vivendo o mesmo fenômeno. Há o Moçambique interior, não o da geografia, mas o interior da alma, que está se confrontando contra essa coisa que a gente chama de globalização, uma certa descaracterização do país.
O senhor sempre faz questão de ressaltar que é moçambicano. No dia-a-dia, por ser branco, sente não ser visto como moçambicano?
Eu sinto que sou moçambicano de uma minoria. Sinto isso, o que dói. Mas não é que me sinto de outro lugar ou de outra nacionalidade. Sei que muitos amigos que são negros têm o mesmo drama que eu. Nasceram dentro da língua portuguesa, viveram uma cultura igual à minha, de língua portuguesa, e têm dificuldades de se reencontrar neste espaço comunitário. Há muito escritor moçambicano que tem o mesmo distanciamento em relação àquilo que é cultura popular. Eu me defino como um diverso, sou moçambicano, sim, esse é o eixo central, mas também sou português, e também sou brasileiro. Alguma coisa que devo à inspiração. Eu sempre dizia que a literatura era o lugar em que eu ia viver. Eu não sou só escritor. Eu só me sinto vivo e me sustento enquanto leio e escrevo neste universo, sou muito brasileiro nesse aspecto. Meus grandes mestres foram Drummond de Andrade, Jorge Amado, João Cabral de Melo Neto, Adélia Prado. Os nomes da referência são muito mais brasileiros que portugueses e moçambicanos.
O escritório de estudos de impacto ambiental é hoje o principal ganha pão do senhor?
Posso confessar que hoje eu já conseguiria sobreviver razoavelmente como escritor. Mas não quero mesmo ser só escritor, por várias razões. Uma delas é exatamente porque a escrita é uma paixão total, e eu não quero dar demasiada importância a isso. Depois, quero manter com a escrita não uma relação lúdica, mas uma relação que não depende da escrita para ganhar dinheiro. É algo que quero preservar. Quando vou à escrita e a escrita vem ter comigo, não tenho aquele drama... eu gosto de fazer muita coisa. Se um dia eu deixar de escrever, provavelmente serei feliz. Quero fazer qualquer coisa que seja criativa.
Comente a frase de um de seus personagens: "O importante não é a casa onde moramos, mas onde em nós a casa mora."
Eu estou prisioneiro de Moçambique. Mesmo que eu esteja vivendo no estrangeiro, o que não planejo fazer, estarei sempre escrevendo sobre minha pequena aldeia de Moçambique. Eu transportarei comigo, como cenário, o meu lugar, que é meu lugar de infância, que já não existe. Estou muito prisioneiro. Nasci numa cidade que depois foi arruinada pelo tempo, pela guerra. E eu tinha medo de regressar a meus lugares de infância, sabia que ia encontrar fantasmas, sabia que ia encontrar essa casa onde fui menino, que estava provavelmente irreconhecível. Primeiro, que você nunca revisita esses lugares. Esses lugares só existem na sua cabeça. Quando eu voltei à minha casa de infância, depois de 30 anos, percebi que essa casa que morava em mim estava protegida. Eu ia ter sempre casa.

África, com amor e raiva

A figura de uma mulher negra, de impenetráveis olhos azuis, dominou a quarta edição da Festa Literária de Porto de Galinhas (Fliporto), dedicada este ano à cultura africana e encerrada no último domingo no balneário pernambucano. Discreta, tentava circular sem ser notada, mas os jornalistas não lhe davam trégua. Afinal, trata-se da primeira mulher a publicar um romance em Moçambique, Paulina Chiziane, nascida há 53 anos em Manjacaze, na província de Gaza, criada no subúrbio de Maputo e com um livro publicado aqui, em 2004, pela Companhia das Letras, Niketche - Uma História de Poligamia.Ao lado do escritor Mia Couto, também entrevistado nesta edição do Cultura, Paulina representa o que há de melhor na literatura africana hoje. Ambos, de facto, se complementam e têm opiniões convergentes sobre a estagnação da cultura moçambicana por força de uma crise de identidade que levou africanos a virar agentes da sua colonização. Há, segundo Mia Couto, um certo racismo, ou uma certa hierarquia eurocêntrica que faz os escritores africanos serem colocados à sombra, impedindo que o resto do mundo saiba o que se passa no continente, assumido por seus intelectuais com um sentimento confuso de amor e raiva.Tanto em Paulina Chiziane como em Mia Couto nota-se certo desânimo pelos rumos que tomou a história de Moçambique desde a declaração de sua independência, em 1975. O escritor considera que o país perdeu sua capacidade de resistência e que nem a língua nem a cultura portuguesa ajudaram a criar uma identidade para os moçambicanos, que se voltam cada vez mais , negros e brancos, para as tradições e os mitos arcaicos. A África não se questiona mais, "perdeu o sentido crítico de se avaliar", diz Mia Couto, seguindo em coro por Paulina Chiziane, assustada com a retromania que empurra Moçambique de volta ao passado.Ambos, Mia Couto e Paulina, tinham 20 anos quando Moçambique se tornou independente. Havia, então, a esperança de uma verdadeira revolução que livrasse o país do atraso e do tacão colonialista. Algo mudou, de fato, e hoje a democracia garante direitos fundamentais como a liberdade de culto - reprimida até pelos revolucionários liderados pelo socialista Samora Machel, que viam as religiões africanas como sinal de obscurantismo. De qualquer modo, nem Mia nem Paulina imaginam suas vidas fora de Moçambique. Estão presos ao país como abelhas numa colméia, condenados a agir não só como escritores - Mia desenvolve estudos de impacto ambiental e Paulina colabora com organizações não-governamentais em projetos de promoção social da mulher, além de ter trabalhado para a Cruz Vermelha durante a guerra civil."Ainda há muito a fazer numa sociedade que reprime as mulheres", diz Paulina, que acabou de lançar, pela editora Caminho, O Alegre Canto da Perdiz, justamente a história de uma mulher negra dividida entre dois mundos, o africano e europeu, por conta de uma paixão que lhe daria um filho mulato "para aliviar o negro de sua pele como quem alivia as roupas de luto". Essa corrida ansiosa atrás do caucasiano é também explicada pela discriminação que a mulher negra sofre em sociedades patriarcais de Moçambique, mais concentradas na província da qual Paulina é oriunda. Lá, uma mulher, além de lavar e cozinhar, deve servir o marido de joelhos e largar tudo o que está fazendo quando este a chama."Reconheço que meus temas não são fáceis, pois trago para a literatura assuntos incômodos, como as conseqüências da poligamia e a prática da feitiçaria na África." Como os africanos conseguem gerir essa dualidade, de cultivar mitos arcaicos e coexistir com o mundo laico, globalizado? "Esse é justamente o tema de meu livro O Sétimo Juramento, em que conto como os africanos, brancos e negros, em momentos de desgraça, recorrem não aos santos cristãos cultuados pelos padres portugueses, mas a entidades de cultos ancestrais pagãos." No livro, o protagonista, David, é um guerrilheiro que, após a declaração de independência, vira diretor de uma fábrica, recorrendo à magia negra para resolver seus problemas.Nos livros de Paulina, nada é o que parece ser. Em Niketche, um oficial de polícia vive à margem da lei, mantendo relações com outras quatro mulheres além da sua, Rami, que, após 20 anos de casamento, descobre ser o marido polígamo. A escritora nega ter a narrativa uma proposta moralizante por pintar o policial, Tony, como pai ausente e marido negligente. Paulina diz que não é feminista. Apenas retratou o que vê em suas andanças por Moçambique: homens espancando mulheres e abandonando filhos à própria sorte. "Com a disseminação da doutrina islâmica, a poligamia cresceu no norte do país e trouxe em sua esteira conflitos com a cultura portuguesa, monogâmica, e as sociedades secretas de feitiçaria, já combatidas pelos revolucionários, que queimavam objetos de culto." E o que pedem essas pessoas aos orixás? "Coisas básicas, como pão, paz e chuva."Falar do futuro de crianças dessa nova raça de pais incógnitos, "que terão de fuçar a sua identidade nas raízes da História", observa, não é uma tarefa fácil. "A guerra acabou, passou o momento épico da revolução e cresceu a criminalidade, o desemprego e a fome" , diz, comentando a emergência de uma elite desinformada e irresponsável em Moçambique. É possível entender o desânimo de Paulina, que viu seu país destruído durante a guerra civil e acompanhou a tragédia cotidiana de seres tão magros "que não se distinguia entre eles homens e mulheres". Ela sobreviveu para contar a história, escapando por pouco de voar pelos ares, como outra mulher com quem conversava, mutilada por uma mina terrestre. Por tudo isso, ela estranhou o clima de festa da Fliporto, que reuniu este ano 161 escritores. "Para mim, é uma coisa nova um ambiente em que se fala de cultura de forma tão agradável." (X)

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Woody Allen: "Sou frívolo e fissurado por mulher"

Por: Beppe Severgnini*

No início desta entrevista, feita em um hotel à beira-mar em Barcelona, Woody Allen parecia cansado e retraído mesmo falando sobre mulheres, o objeto de sua frivolidade assumida. Disse coisas como: "Não tenho interesse pela vida real." Ou: "Só falo dos meus filmes para ajudar os produtores." Mas se animou quando a conversa derivou para a política. "Sim, gosto de política. Não como artista, mas como cidadão", declarou, dias antes da eleição de Obama.
Podemos falar sobre seu novo filme, Vicky Cristina Barcelona?
Só falo dos filmes que faço para ajudar os produtores... Mas se dependesse só de mim, eu não falaria nada. Você realiza um filme e, se ele for bom, as pessoas vão vê-lo. Não seria preciso falar dele. Mas se ele não for bom, por mais que eu fale...
Noto que alguns críticos disseram que o filme é voyeurista. Concorda?
Voyeurista? Bem, somente no sentido de que um filme é uma coisa visual. Vicky Christina Barcelona não é nada voyeurista. Tive à minha disposição um elenco principal sexualmente carismático e poderia até ter explorado essa situação para voyeurismo, com grande respaldo artístico. Mas eu fui muito, muito comedido.
O sr. diria que, com o avanço da idade, está ficando mais fascinado pela beleza feminina?
Sempre fui! Mesmo quando criancinha, eu sempre fui fissurado por mulheres. Você sabe, eu sou muito frívolo. E um de meus traços frívolos é uma obsessão pela beleza. Durante a guerra, eu podia admirar como Rita Hayworth era magnífica... E nunca deixava de admirar a beleza nas garotas de minhas salas de aula. Isso é um traço frívolo, porque exclui todos os aspectos mais valiosos e sensíveis das mulheres que não são belas.
O sr. se interessa pelas vidas amorosas de seus atores?
Não, não tenho nenhum interesse pela vida real. Isto é, eles são ótimas pessoas, mas nunca ?socializo? com meus atores. Conheço Scarlett Johansson há anos, mas jamais almocei ou jantei com ela. Se ela estivesse bem aqui em pessoa, você pensaria: "Oh, ela é muito bonita", mas quando você a fotografa, ela se torna mais ainda. Agora, Penelope Cruz na tela é incrivelmente bela, mas quando você a encontra em pessoa, ela é ainda mais bela. Quando encontrei Penelope pela primeira vez - eu a tinha visto em Volver e achei que ela era muito linda - não conseguia acreditar o quanto ela era linda. Era uma coisa meio sobrenatural, como se ela tivesse vindo de Marte ou Júpiter.
Seus filmes recentes - Match Point, Scoop - o Grande Furo e agora este - são muito agradáveis. Mas como muitos outros, sinto falta do velho Woody Allen. Você parece ter outra coisa em mente agora. Será justo dizer que o velho Woody Allen das gargalhadas acabou?
Sim, mas acho que deixei isso há muitos anos. Fiz uma certa quantidade de filmes cômicos no começo, depois comecei a fazer filmes diferentes, mais sérios. Crimes e Pecados e Hanna e Suas Irmãs se saíram muito melhor que Bananas, Um Assaltante bem Trapalhão e Tudo Que Você sempre Quis Saber sobre Sexo, mas Tinha Medo de Perguntar.
Por falar em Bananas, já pensou em fazer outro filme político?
Sim, pensei. Mas meu problema de sempre são os orçamentos. Eu trabalho com orçamentos pequenos, e fazer um filme político nos Estados Unidos, onde eu teria que fazê-lo, custaria muito mais dinheiro do que eu seria capaz de captar.
Acha que poderia fazer um filme que tivesse ampla aceitação em todo o território dos EUA? Ou Woody Allen é ligado demais a Nova York?
Nas cidades grandes e nas cidades universitárias, eu tenho boa aceitação. Mas a maioria do país não é isso. A maioria do país é o que chamamos de Estados vermelhos: Estados-Bíblia, Estados republicanos, Estados armas. E há pessoas nesses Estados que gostam de meus filmes, mas não a maioria. Não que elas não gostem de cinema; meus filmes nem sequer estariam em seu radar.
Não acha que Sarah Palin (que foi colega de chapa do candidato presidencial republicano John McCain) daria uma personagem fantástica para um filme de Woody Allen?
Oh, ela é divertida. Mas já foi bem explorada nas sátiras da televisão. Ela foi uma escolha estúpida, nada que mostrasse muito respeito pelos Estados Unidos. Serviu apenas para dar uma pequena ajuda momentânea à campanha, pelas tiradas divertidas. Mas acho que os americanos, por mais ridículos que tenham sido nas eleições anteriores, aprenderam alguma coisa.
Você gosta de política? Nós estávamos falando de cinema e você parecia cansado. Agora parece mais......
mais animado?
Isso. Mais interessado.
Sim, gosto de política. Não estou interessado em política como artista, mas como cidadão. Como sabe, eu voto. Contribuo com dinheiro. Fico feliz de fazer campanha por alguém.
Al Gore teria sido bom presidente?
Sim, acho que ele teria sido um bom presidente. Acho que é um homem inteligente e foi um mau candidato. Ele não teve carisma, não teve energia para concorrer, ele não conseguia focar. Mas daria um presidente muito bom porque é uma pessoa decente e é favor de uma agenda democrática, liberal.
Se pudesse voltar no tempo, gostaria de se tornar um grande tocador de clarineta, um ícone dos esportes, um grande escritor ou George W. Bush? Qual seria a sua escolha?
Um grande músico, pois a música supera tudo. É emocional e todo mundo adora música.
* Esta entrevista foi publicada originalmente no jornal The New York Times.

Homem de Sentimentos fortes

Iniciado em 1971, o livro Conversas com Woody Allen (Cosac Naify, 512 págs.) do jornalista norte-americano Eric Lax, cobre metade da vida do mais engraçado cineasta dos EUA, que abandonou o trem de Fellini para pegar o vagão de Bergman e embarcar no chamado cinema "sério", ao filmar, em 1978, o hoje clássico Interiores, seu rito de passagem. Woody Allen, diretor de Vicky Cristina Barcelona, confirma em sua entrevista que é a pessoa menos indicada para falar de seus filmes. E também que não faz o mínimo esforço para acabar com a fama de anti-social.
Apenas uma pessoa, o jornalista Eric Lax, seu biógrafo, parece capaz de arrancar dele declarações que joguem alguma luz sobre esse autor que pouco se importa com o público, chegando a usar como título de trabalho de um seus mais badalados filme, Annie Hall (Noivo Neurótico, Noiva Nervosa) a palavra Anedonia (que significa incapacidade de sentir prazer). Lax, em sua entrevista exclusiva ao Estado, garante que, apesar do título exótico, Allen não é uma pessoa indiferente. "Na realidade, é um homem de sentimentos fortes, embora controlado", define o jornalista.
Lax diz que todas as entrevistas foram editadas sem cortes, embora admita ter aceitado sugestões de Allen e inserido alguns esclarecimentos para que suas declarações não parecessem ininteligíveis como as de Casey Stengel, o treinador do New York Yankees.
O título original de Annie Hall (Noivo Neurótico, Noiva Nervosa), era Anhedonia (Anedonia), que significa a incapacidade de sentir prazer, algo muito próximo à imagem que se tem de Woody Allen, considerando seus filmes.
Você classificaria seu biografado de indiferente?
Como muitas pessoas engraçadas, Woody tem uma visão melancólica da vida. Não diria que é indiferente. Na realidade, é um homem de sentimentos fortes, embora controlado. Ele não se permite sentimentos extremos de euforia ou infelicidade. Ao contrário, move-se dentro de uma faixa estreita de emoção, que o protege e permite que se concentre em seu trabalho. Nunca encontrei em minha vida alguém tão disciplinado. Não importa como se sinta, ele se obriga todos os dias a escrever e a estudar clarineta. Essa disciplina é uma das razões de sua prolífica produção.
Entre os filmes favoritos de Woody Allen estão A Rosa Púrpura do Cairo, Match Point e Maridos e Esposas. E você, quais são os filmes que considera os mais reveladores de sua personalidade?
Todos os três filmes citados representam parte da filosofia pessoal de Woody. A Rosa Púrpura do Cairo trata da diferença entre a fantasia, como mostrada nos filmes vistos pela personagem de Mia Farrow, Cecília, e a realidade. Seria maravilhoso se o galã saísse da tela e Cecília pudesse fugir com ele, mas isso é apenas um sonho. A realidade é que Cecília vive em plena Depressão americana dos anos 1930 e é casada com um um homem egoísta e rude. Já Match Point traduz sua desconfiança de que não há nenhum Deus olhando por nós para nos recompensar ou punir. Se escolhemos matar alguém e não formos pegos pela polícia, então podemos seguir em frente. Woody argumentaria, contudo, que, mesmo diante de um universo indiferente, devemos agir dentro da lei, porque isso dá satisfação pessoal e, se assim não fosse, seria o caos. Ele diria: faça o bem, mesmo que não receba nenhuma recompensa. Mas fazer o bem por conta própria é provavelmente mais difícil do que por conta de uma ameaça religiosa. O Sonho de Cassandra, creio, é uma espécie de conclusão de Match Point: alguém comete um crime, mas sua consciência não o deixa em paz.
Alguns críticos ficaram frustrados com as poucas revelações da vida pessoal de Allen em seu livro. Por que evitou perguntas pessoais em seu livro?
Escrevi uma biografia de Woody há 17 anos e publiquei uma edição atualizada quando ele e Soon Yi Previn se casaram. Esse livro está cheio de detalhes da vida pessoal de Woody. Já Conversas com Woody Allen não é uma biografia, mas um olhar sobre a evolução do artista nos últimos 36 anos. Versa sobre um diretor e sua obra. Concluímos, ele e eu, que seria melhor organizá-lo do jeito que está, acompanhando ano a ano essa produção, do que esperar para rememorar fatos que aconteceram, 20, 30 ou 50 anos antes. Este livro é como um álbum em que cada conversa foi registrada na época, sem modificações, permitindo que o leitor possa imaginar como Woody se sentia, por exemplo, nos anos 1970, quando começou.
Quando você o conheceu, em 1971, Woody disse que havia algo de imaturo, de segunda classe, na comédia, quando comparada ao drama. Em sua opinião, o que fez, então, o diretor escolher o primeiro gênero em sua estréia?
Ele era realmente bom na comédia e foi assim que construiu sua carreira. Esperava que os estúdios, depois que ele tivesse feito um nome como cômico, financiassem seus dramas, o que, de fato, acabou acontecendo.Depois da biografia de Woody Allen, você publicou alguns outros livros no gênero, entre eles as vidas de Humphrey Bogart e Paul Newman.
O que é mais difícil: escrever sobre um ídolo morto ou um autor vivo?
A biografia de uma pessoa viva é, por definição, incompleta e ninguém, incluindo aí o biografado, sabe o que acontecerá no futuro. Então, podem acontecer reviravoltas que venham a desmenti-la. Se o sujeito está morto, então o escritor tem as entrevistas e documentos para trabalhar e a história pode ser vista como um todo. Woody jamais reclamou de nenhuma revelação que tenha feito sobre sua vida, mesmo a de que casou virgem, aos 20 anos. Verifiquei pelo menos duas vezes cada informação sobre sua vida.
Allen reconheceu que você é uma das poucas pessoas que realmente o conhecem bem. O que o fez mudar de idéia a seu respeito, considerando que sua primeira entrevista com ele foi um desastre?
Conversas correm bem quando ambos estão confortáveis. Ele era uma pessoa muito tímida na primeira vez que nos vimos e eu estava mais nervoso do que deveria, então trocamos apenas algumas palavras. As respostas dele foram sucintas e pensei que nunca mais nos veríamos. Mas não. Ele me telefonou, fizemos uma nova entrevista e as coisas melhoraram, a ponto de sermos amigos desde então.
Nas entrevistas, Woody Allen mostra-se autodepreciativo, embora bastante honesto, mas evita explicar seu lado anti-social. Por que ele nunca vai a festas em sua homenagem e recusa receber prêmios?
Creio que sua timidez crônica seja a resposta. Ele não suporta fazer conversas tolas e detesta prêmios em geral. Diz que os prêmios, de certa forma, prejudicam o artista, argumentando que, se você aceita um prêmio, aceita também a opinião de quem o deu e terá de aceitá-la novamente se essas mesmas pessoas decidirem que seu filme seguinte é um fiasco. Para ele, a platéia-alvo de seus filme é ele mesmo, embora, claro, fique muito feliz quando um filme como Match Point, que é talvez aquele que mais o agrada, faz sucesso junto ao público e tenha ressonância crítica.
Seu livro, como disse, é um álbum que contempla metade da vida de Woody Allen. Além de sexo e sua admiração por filmes europeus, qual é o tema mais freqüente das conversas entre vocês?
Esportes, livros e crianças, além da seus filmes, que ocupam boa parte dessas conversas.
Woody Allen tem algum projeto irrealizado, algo ambicioso que ainda pretende fazer?
Sim, ele gostaria de fazer um filme chamado American Jazz, sobre o desenvolvimento do jazz.
Allen já pensou em escrever a autobiografia, como disse em algumas entrevistas, o que leva automaticamente à pergunta: ele não autorizou a publicação de alguma passagem de seu livro?
Posso garantir que as entrevistas foram publicadas na íntegra, sem edição, em todos os países onde o livro foi lançado. No Brasil, inclusive.