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sexta-feira, 17 de abril de 2009

Um olhar sobre a canção moçambicana nos anos 60 e 70 (*)


Por aqueles anos, salvo melhor opinião, a música ligeira de Moçambique estava ancorada nas terras do rand, Africa do Sul. Atrevemo até a dizer que Fany M’Pfumu, Alexandre Langa, Moniz Nothisso, Daniel Marivate, Alfiado Vilanculos, Lisboa Mathavele, Dilon Njinji, Francisco Mahecuane, Alexandre Jafete e tantos outros, não teriam certamente sido aquilo que vieram a ser se não tivessem desenvolvido a sua arte e as suas potencialidades na África do Sul. Em Moçambique não havia, nem mercado, nem indústria discográfica que os pudesse sedimentar.

Existem pelo mundo fora, na forma original, os registos discográficos que aqueles nossos artistas fizeram, cujas matrizes originais são mantidas pelas gravadoras que os registaram, não sendo por isso despropositado apelar, aqui e agora, que as entidades da cultura nacionais procurem resgatar aquele riquíssimo património.

Um exemplo propositadamente escolhido até para lançar mais achas na discussão em curso (que eu pretendo sã e desapaixonada), temos a versão de «João Domingos» para o tema «Georgina». Escutando com atenção, notaremos que está nela patente o ritmo da marrabenta, a primeira, ou talvez a mais conhecida expressão estilizada da música ligeira produzida em Moçambique. E porque está em voga uma discussão interessante sobre a origem da marrabenta, que tal metermos uma colherada na matéria por um ângulo bem diferente daquele por que temos acompanhado o debate?

Em 1959 (já já vai meio século), em Joanesburgo, Alexandre Jafete gravou um tema a que deu o título de Marrabenta, através do qual critica a juventude de então por se alhear do trabalho, do estudo, da higiene, do casamento, dos bons hábitos, de tudo por causa da marrabenta. A marrabenta era, então, uma forma de alienação cultural. Em todas as épocas e em todas as latitudes as coisas novas provocam estas reacções. Foi assim com a bossa nova, no Brasil, com o blues, jazz, swing e soul, nos Estados Unidos, com o yé-yé, em todo o mundo, com o twist, e até com o xitsuketi , entre nós.

Alexandre Jafete Simbine, de seu nome completo, estudou no Colégio de Khambine, no distrito de Morrumbene, em Inhambane, nos anos 40. Conta um seu condiscípulo que a grande paixão que Jafete nutria pela música fê-lo abandonar o colégio, levando consigo um pequeno tesouro da sua turma: o hinário da Igreja Metodista Episcopal. Ao que se sabe, Alexandre Jafete nunca mais voltou a Moçambique, acabando por morrer, ao que se diz assassinado, na África do Sul.

A questão que se coloca é: defendendo-se com veemência que a marrabenta nasceu e se desenvolveu no bairro da Mafalala, na então Lourenço Marques, de que marrabenta fala e canta, então, Alexandre Jafete? Pergunta pretensiosa, admito, mas talvez a merecer uma modesta resposta dos entendidos, que presumo existirem entre nós.

(*) Este artigo, da autoria de Luís Loforte, foi publicado no programa da Rádio Moçambique O Clube dos Entas e foi adoptado por mim para este espaço virtual. Assim, e porque para uma melhor compreensão das ideias de Loforte (colaborador do programa), necessário se torna que os interessados escutem aquele programa esta quinta-feira (16) as 22H05 e segunda-feira (20) as 02H05 na frequência 92.3 (FM).

1 comentário:

  1. Na noite de quinta-feira fui sacudido pelo telefonema de um amigo, que me chamava a atenção ao programa que passava na Rádio.
    Sintonizei e fui a tempo de ouvir a música de Alexandre Jafete e fiquei maravilhado.
    Indo ao ponto e sem ser entendido na matéria, sempre direi que há factos concretos que apontam para o sentido contrário ao que sempre foi defendido: a marrabenta, pode ter-se desenvolvido na mafalala, mas não nasceu lá.
    E para alicerçar este ponto de vista, vale a pena, lembrar uma outra m¬úsica também da mesma época (1951 gravado na Columbia e/ou Trobadora) e pertencente a Eusébio Johane Tamele, cujo título e se não estou em erro é "Uni mjikha” onde Zeburani canta num trecho que hakunene, hakunene a Sangarassia (em referência a Ressano Garcia) kungani majikha/ a Sangarassia kungani marrabenta/utafa usiya marrabenta…e a pergunta sempre pertinente: a que marrabenta fala e canta, então, Zeburani?
    É preciso que os entendidos de facto, saiam e se pronunciem sobre este e outros pontos, porque importantes, para a construção da nossa identidade cultural e para a verdade que nos deve interessar acima de tudo.
    Um outro facto que me chamou a atenção neste programa, foi a música do Mahecuane, cantada em cantonês. Na verdade, o meu amigo Hortêncio Langa, já me tinha chamado atenção a aquela música que na verdade, diz ter ouvido na sua infância e que de lá para cá nunca mais a tinha ouvido.
    Penso que a par do trabalho que os organismos competentes de cultura deste pais devem realizar, porque sabido que existem no “pelo mundo fora, na forma original, os registos discográficos que aqueles nossos artistas fizeram, cujas matrizes originais são mantidas pelas gravadoras que os registaram, não sendo por isso despropositado apelar, aqui e agora, que as entidades da cultura nacionais procurem resgatar aquele riquíssimo património”, a Rádio Moçambique, devia também preocupar-se em reeditar o seu espólio, mesmo sem se preocupar com a qualidade do produto final, porque muitas das vezes o que interessa é ter o produto nas mãos, com as matrizes originais salvaguardadas.
    Os questionamentos do Loforte não são pretensiosos, na verdade, legítimos e prementes….e parabéns a si Galiza pela verticalidade, e por este desejo incessante de busca que acredite, nos alimenta, a nós desejosos de verdade. Ainda que minoria.

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